O que é o último teorema de Fermat e por que os matemáticos levaram 3 séculos para resolvê-lo
Esta história começa com um enigma matemático escrito em latim na margem de um livro antigo.
o texto dizia:
Isso foi escrito em 1637 pelo advogado e matemático
francês Pierre de Fermat.
A anotação no livro foi descoberta depois da morte de Fermat, mas a tal "prova matemática
maravilhosa” jamais apareceu.
Sou Malu Cursino, da BBC News Brasil, e neste vídeo falo sobre esse problema que, durante
mais de 350 anos que se passaram, foi ganhando proporções míticas.
Isso porque algumas das mentes mais brilhantes da matemática tentaram resolvê-lo e fracassaram.
Exceto uma. Esta é a história do
último teorema de Fermat
Fermat é famoso não só por ter feito algumas das descobertas mais importantes da história
dos números, mas também por fazer anotações nas margens dos livros.
Os matemáticos tomaram essas notas como desafios e, ao longo dos anos, foram resolvendo cada
um dos enigmas até que só sobrou um: o último.
O que faltava para decifrar o último teorema de Fermat era, abre aspas aqui, “somente”
a prova matemática, ou seja, a série de argumentos lógicos que, passo a passo, comprovam
que o teorema é verdadeiro.
E na matemática, a comprovação das teorias não admite aproximações: ela deve ser absoluta.
Esse ponto é fundamental para entender o enorme esforço intelectual dedicado à demonstração
do teorema ao longo dos séculos.
Além disso, parte da fama desse teorema vem do fato de que a matemática que a gente conhece
hoje seria irreconhecível se não tivessem ocorrido tantas tentativas de resolver o enigma.
Um exemplo disso é o conceito matemático de “ideal”, que é central na álgebra
moderna e que veio à tona justamente após uma tentativa fracassada de demonstrar o último
teorema de Fermat.
Mas o que provavelmente torna esse enigma mais interessante é o fato de que ele parte
de uma equação que aprendemos na escola, e que muitos guardam na memória por anos
e anos.
É essa aqui:
"X" ao quadrado mais "y" ao quadrado é igual a "z" ao quadrado.
Sim, estamos falando do teorema de Pitágoras. Aquele que diz que, em todo o triângulo retângulo,
o quadrado da hipotenusa é igual à soma
dos quadrados dos catetos.
Se a gente parar pra pensar, dá pra encontrar outros números inteiros que podem substituir
o “x”, o “y” e o “z” e, mesmo assim, resolver a equação.
Para ficar no exemplo clássico:
Três ao quadrado, que é igual a nove, mais quatro ao quadrado, que é dezesseis, é igual
a cinco ao quadrado, que é vinte e cinco.
Agora, o que aconteceria se a gente mudasse o expoente e, em vez de dois, colocasse um
3?
Ou um 4, um 5, ou um 532.
Tanto faz.
Resumindo: o que aconteceria se a gente colocasse qualquer outro número inteiro positivo -- ou
“n” -- no expoente?
Fermat disse que, por mais que a gente busque, nunca vamos encontrar uma solução.
De acordo com o último teorema do matemático, a igualdade não se configura quando o expoente
“n” é maior que dois. O próprio Fermat
conseguiu provar isso, no caso em que n é igual a 4.
Logo, vieram outros matemáticos famosos, como o suíço Leonhard Euler, que comprovou
a teoria para quando “n” for igual a 3.
É claro que ainda ficou faltando uma quantidade infinita de números, e não faria sentido
ir testando um por um.
Faltava mesmo uma prova matemática absoluta, que se aplicasse a qualquer valor possível
de “n”.
É aqui que entra o matemático britânico Andrew Wiles.
Wiles conheceu o teorema de Fermat quando tinha apenas 10 anos e, já com essa idade,
passou a sonhar em resolvê-lo Depois que virou matemático, no entanto,
Wiles não se dedicou a estudar apenas o teorema dos sonhos de criança.
A história já tinha mostrado que era possível passar anos fazendo tentativas sem que se
conseguisse chegar a uma solução.
Mas em meados dos anos 80, ele decidiu embarcar em um projeto secreto e solitário para resolver
o enigma.
Essa missão acabaria tomando 7 anos da vida dele, período em que só a mulher de Wiles
sabia o que ele fazia naquele sótão de Nova Jersey, nos Estados Unidos.
Em 1993, o matemático revelou ao mundo durante uma conferência que havia chegado à prova
matemática do último teorema de Fermat… Pelo menos era isso que ele pensava.
Na verdade, ele descobriu dois meses depois que a prova tinha um erro.
A notícia foi devastadora, e fez Wiles trabalhar ainda mais, de forma frenética e estressante.
Um ano depois, ele finalmente conseguiu pôr um fim a esse mítico desafio matemático.
A comprovação de Wiles exigiu o desenvolvimento de novas ferramentas matemáticas e se baseou
em trabalhos de outros acadêmicos.
Fez, inclusive, a ligação entre conceitos que ninguém imaginava que pudessem estar
vinculados.
Para entrar em detalhes sobre a prova matemática em si, seria preciso explicar cada uma dessas
peças, o que requer anos de conhecimento especializado.
Mas só pra gente ter uma uma ínfima ideia, um dos conceitos-chave por trás da demonstração
são as curvas elípticas, que não são nem curvas, nem elipses...
O que dá pra dizer é que, em 2016, Wiles recebeu o Prêmio Abel, também chamado de
Nobel da Matemática, por sua “impressionante” demonstração do último teorema de Fermat.
A solução do enigma proporcionou diversos avanços teóricos, além de ter aplicações
no campo da criptografia e na teoria dos códigos.
O que nunca saberemos é se a solução de Wiles é a mesma que Fermat não escreveu
naquela margem de seu livro.
Wiles acredita que não, que seria impossível chegar a uma demonstração como a dele antes
do século 20.
E como essa solução histórica usou elementos do trabalho de muitos matemáticos, vou deixar
vocês agora com a lista de nomes do jeitinho que ela aparece no documentário “O Último
Teorema de Fermat”, da BBC, que eu recomendo muito para todos que queiram se aprofundar
nesse tema fascinante.
Eu fico por aqui, nos vemos no próximo vídeo.