As Praças - Edição de 24 de dezembro 2012 - Praça do Toural, Guimarães - 06
06
Jornalista
Poderíamos perder-nos no bosque que a alameda de S. Dâmaso sugere, encontraríamos entretanto uma clareira, saberíamos regressar ao rumor de água e vozes desta praça do Toural, onde cada uma das minhas cicerones elege um momento, um momento singular da sua própria relação tão intensa com este lugar.
Arquiteta:
Na minha história remota, o 26 de abril de 1974, em que de facto, as pessoas confluíram para o Toural para celebrarem a liberdade e foi a primeira vez que eu vi o Toural com tanta gente, tão animada e de facto numa manifestação absolutamente espontânea, fantástica.
Num tempo mais próximo, o 13 de dezembro, a abertura do novo Toural, com esse ganho que a cidade percebeu imediatamente de uma volumetria e de um espaço que permitia muitas interpretações e muitas apropriações, e depois o dia 21 de janeiro, de facto com a abertura da capital europeia da cultura, com um número de pessoas que confluíram para aquele espaço e sobretudo a orquestra, com um espetáculo …as fachadas iluminadas com os vídeos e foi de facto um momento fantástico. Portanto, é o local da celebração, do encontro de todas as gerações, de todas as pessoas e da indeterminação das apropriações que eu acho que isso é de facto o que marca a ideia de cidadanias plurais… hoje já nem se fala da ideia de cidadanias plurais …que permitem essa indeterminação e essa apropriação coletiva e individual dos espaços e das cidades como espaços para as pessoas e das pessoas. Eu confesso que para além destes momentos de exceção a mim o quotidiano não me interessa muito nas cidades e portanto a forma como o Toural e este espaço é usado no seu dia-a-dia é crucial, porque quando intervimos em situações desta natureza, então em centros históricos e em cidades com a importância histórica que Guimarães tem, é evidente que entre o uso quotidiano e o uso sazonal ou turístico, são dois temas que estão sempre no prato da balança das decisões e que muitas vezes são difíceis de compatibilizar, compatibilizar o quotidiano com a exceção também, não é? Portanto, ou seja, se a exceção por um lado de alguma forma está assegurada pela sua própria dimensão, o problema colocava-se muito em termos do uso quotidiano e não propriamente no voyeurismo turístico que esse funciona sempre, não é difícil de pôr a funcionar numa cidade que tem a riqueza imensa que Guimarães tem em termos do seu património construído. É verdade, o Toural é uma praça, tornou-se uma praça maior, é uma praça um bocadinho agreste no mau tempo e portanto aí é um espaço de atravessamento, sem dúvida, mas sempre foi, não é impossível, em cidades do norte, em pleno inverno, em dias de muita chuva e muito vento ninguém para exatamente no meio destes locais, agora quando o tempo começa a amenizar, tudo se transforma de alguma maneira e então quando chega a noite e as noites de verão, são sítios espantosos para se permanecer no quotidiano. Bom, e nesse sentido eu confesso que tenho uma particular predileção pelos dias de… bons, aqueles em que há sol, em que as pessoas ao domingo começam a sair das missas, há muitas igrejas aqui à volta, há a tabacaria onde se compra o jornal, há uma tenda onde se bebe o café, as missas funcionam a horas diferentes e eu acho que o Toural funciona como um local de encontro verdadeiramente interessante, com muita gente muito diferente em sítios de facto a conversar em pequenos grupos por aqui adiante, uns sentados nos bancos, outros à sombra e tal, e é um funcionamento de facto do dia-a-dia da cidade, o pulsar normal da cidade que a mim me interessa particularmente, confesso.
Jornalista:
Os sinos parecem sublinhar o sentido de celebração que estas palavras têm num sábado frio em plena praça do Toural, em Guimarães.
Aldo Rossi, que Maria Manuel Oliveira muito aprecia, escreveu que “as praças podem assumir muitos tempos na forma das cidades” … isso é tão evidente no modo como este Toural resgatou a cidade da vertigem da aceleração do tempo. Boas Festas!